(in Jornal de Vagos, n.º577, 25 de junho 1910)
Santo Antonio:Realizou-se, como haviamos notíciado, a festa ao popular Santo taumaturgo português, na sua capela de Sandelgas. Visitámos a capela, que já não viamos há uns bons trinta anos, e ficamos bem impressionados com o seu aspecto, agora mais amplo e airoso, tendo os altares uma ornamentação de artistico efeito. Visitámos a sacristia aonde estava uma pequena imagem de Nossa Senhora, de primorosa escultura, carregada de ouro. Visitámos a casa das esmolas, aonde o pote de azeite estava cheio, o que prova que o Santo Antonio tem bastantes devotos que a ele recorrem nas horas angustiosas. A capela dá a ideia de uma pequena igreja paroquial, pois que até lhe não falta a respectiva cadeira colocada no logar próprio. O arraial estava pouco concorrido, não obstante a música da nossa terra, ali exibir as melhores peças do seu reportorio, e para a tardinha abrandado a temperatura, tornando agradavel o passeio ao arraial.
Não assistimos á festa de igreja, o que nos impede de fazer o seu relato, mas consta-nos que a orquestra e vozes andaram muito bem, sendo auxiliadas por duas crianças filhas do sr. Dr. João d'Almeida e Silva, Neste dia realiza-se o tradicional jantar que, desde tempos antigos, a familia Domingues Ribeiro oferece ás pessoas de suas relações. O costume do jantar foi estabelecido por um padre, chamado o padre do Canto, um eclesiástico que viveu no lugar do Corgo do Seixo, no local chamado o Canto, e que para seu uso fez construir parte da capela de Santo Antonio, que hoje é a capela mor. Tendo estudado no convento de Santo António em Aveiro ordenou-se clérigo, e como não tinha capela no logar para celebrar missa, ía dize-la a São Romão que lhe ficava distante, e foi esse o motivo por que mandou construir a capela referida. Para isso comprou por trinta mil reis o terreno a um homem de apelido Sandelgas, que lhe ofereceu uma imagem do convento deste lugar, e daí o título que se dá ao Santo António.
Atualmente o padre do Canto é representado pelo sr. Manuel Domingues Ribeiro, que continua as tradições da casa, oferecendo todos os anos aos seus amigos um jantar de festa, o qual sai das normas da maior parte dos jantares da aldeia, pois que é de uma confeção distinta e variada, e este ano sob a direção do seu simpático neto, Artur Sérgio, com um menu muito primoroso. Ora pois de tradições também vive o homem, e as tradições familiares têm um cunho de afeto que muito agrada.
Também se festejou o Santo António da Quinta, em Vagos, que tem o seu nicho às portas do palacete do Visconde de Valdemouro, e que teve a sua costumada véspera, e o caseiro, o nosso amigo José Tomás de Abreu, enfeitou o nicho com bandeiras, festões e outros ornatos. O sentimento religioso e devoção ao Santo António, vive ainda muito arreigado no coração.